Perspectivas da luta de classes no Brasil em 2022

Perspectivas da luta de classes no Brasil em 2022

O país ingressa em 2022 em meio a sintomas claros de que tem pela frente um ano já marcado por sinais de uma conjuntura complexa e rica, cuja dinâmica certamente vai gerar fatos e acontecimentos políticos que condicionarão  a luta de classes por um largo tempo. E o chão em que já se desenrolam os embates em torno do controle da máquina estatal – que é o que está em jogo – são as eleições de outubro, que, além do presidente da República, escolherão deputados federais e estaduais, governadores e senadores.

Do lado do proletariado não se pode seriamente esperar um ascenso de lutas diretas, unificadas, em torno da defesa de seus direitos e conquistas. Desde há muito os trabalhadores têm mais que motivos para desencadear tal luta, dado o aprofundamento da exploração e da miséria de que são vítimas estruturais. Desgraçadamente, o proletariado brasileiro não tem consciência de classe, sequer uma consciência sindical, aquela em que se considera o patrão um inimigo. Nada disso. E mais distante ainda de uma consciência política, revolucionária, que aspira à tomada do poder e à construção de um estado socialista.

As razões desta situação já foram analisadas com o aprofundamento e os detalhes necessários aqui neste espaço. De todo modo, é sempre importante ter presente que essas razões podem ser sintetizadas na soma perversa da ação repressiva e político-ideológica por parte da burguesia com a opção da esquerda pelo caminho da democracia, ou seja, do fortalecimento do estado burguês. Só para ficar no passado recente, a atuação da esquerda, da quase totalidade da esquerda, no processo de substituição da ditadura militar 64/85 – processo por sua vez vanguardeado pela própria burguesia – foi marcada por táticas e estratégicas que, em suma, fizeram da esquerda não mais que um vagão esfarrapado da locomotiva burguesa, ostentando a bandeira da democracia, como se a democracia não interessasse a esta burguesia, como se a democracia não constituísse a melhor forma de dominação política dos patrões. Ideologicamente parametrada pela grande e pequena burguesias, a esquerda não levou em conta a elementar lição histórica de que a burguesia usa o fascismo, a ditadura militar e a democracia de acordo com as circunstâncias da luta de classes, optando pela forma de organização do estado que preserve seus interesses, seus lucros, sua propriedade, em dado momento. No longo prazo, é a democracia a forma mais sólida e efetiva da dominação política da burguesia.

Do lado da burguesia são claros os indicadores de uma crise de liderança política. Apesar dos pesados esforços, sua gigantesca máquina de propaganda em todos os meios e gêneros comunicacionais, apesar de seu poderio financeiro de inesgotável capacidade corruptora, a burguesia não conseguiu ainda encontrar seu candidato à presidência. Bolsonaro já demonstrou à exaustão sua incomparável incapacidade de gerir os negócios dos donos dos meios de produção (materiais e ideológicos) e circulação, de dar estabilidade ao sistema. Recorrer a um golpe militar ou fascista? Não há base material para isso: a) falta o apoio de uma base militar da ativa com força suficiente para disparar e sustentar um golpe; b) falta apoio internacional, principalmente da União Europeia e dos Estados Unidos, lembrando-se que Argentina, México, Bolívia, Chile e Peru vivem hoje sob regimes democráticos, bandeira eleitoral que levou ao poder seus atuais governantes; c) falta de apoio midiático, com a Rede Globo em guerra aberta, sem volta, contra ele; d) por último, mas não menos importante, falta o apoio da … burguesia!

A chamada “terceira via”? Até agora, nada. E não se veem no horizonte sinais de sua viabilidade. Os megaoportunistas Moro e Ciro Gomes, antropófagos um do outro, não conseguem ultrapassar a marca dos 10% nas pesquisas. O governador de São Paulo João Dória, a esperança inicial, já despencou para algo como 2% da preferência dos eleitores.

E, assim, Lula navega de vento em popa em águas serenas em direção a um novo mandato presidencial, com as pesquisas apontando a possibilidade de vitória até mesmo no primeiro turno, garantida a vitória final se um segundo turno se fizer necessário. Os percentuais mais recentes verificados em todas as pesquisas marcam uma diferença de vinte pontos percentuais de vantagem de Lula sobre Bolsonaro: 48% contra 28%. E não se verificam indícios de superação da polarização Lula x Bolsonaro.

Ilude-se, contudo, quem acredita que Bolsonaro aceitará a derrota eleitoral. Tanto pessoal como politicamente. Do lado pessoal, a psicopatia  indiscutível de que é portador, aliada à sua oceânica ignorância, não o permite identificar as causas da enorme queda de sua popularidade exibida, inclusive, nas pesquisas eleitorais. Em sua mente doentia, sempre há um complô, um traidor, uma manobra contra seus nobres ideais de “deus, pátria e família”. E que família! O fato é que o capitão cria diariamente fatos e factoides que só fazem mais caírem suas possibilidades eleitorais, ensejando inclusive, semana passada, a que aliados de primeira hora, como os seus ex-ministros Weintraub e Araújo, o desancassem publicamente. O general de reserva Carlos Alberto Santos Cruz, também ex-ministro, não lhe poupou adjetivos pesados: canalha, mentiroso, covarde. É… os ventos sopram forte contra Bolsonaro. As dificuldades econômicas à frente não lhe permitirão manobras eleitoreiras de maiores efeitos. A gasolina já chegou aos $8,00 reais, sem perspectivas de contenção da linha altista.

Que recurso restará então a Bolsonaro? Uma tentativa de golpe. Pode-se tomar como quase certa uma tentativa de um golpe bolsonarista. O bolsonarismo é mais que a pessoa de Bolsonaro, que não mais que expressa opiniões e sentimentos fascistoides de uma parcela mais que significativa da população brasileira – há quem calcule um número provável de 30 milhões de pessoas adultas, que o pressionarão na linha do golpe dada a certeza de que, vencendo Lula, privilégios, ‘boquinhas’ e ‘oportunidades’ desaparecerão.

Mas tentar o golpe não significa conseguir dar o golpe, dada a falta de condições acima exposta. O desenvolvimento específico das lutas de classes, seus fatos constitutivos, não é previsível hoje. De todo modo, uma esquerda que se pretenda séria não pode se deixar levar pelos mitos de que “a democracia resolve tudo”, de que “as instituições são sólidas” e, até, pela rasteira fábula de que “o brasileiro é um povo pacífico e ordeiro”. Não. Não se pode, inclusive, descartar uma tentativa de assassinato contra Lula – não ordenada por Bolsonaro, que, mesmo burro como é, sabe que isso somente o faria cair ainda mais –, urdida por uma de suas bases milicianas por iniciativa própria, já que, perdendo Bolsonaro, é possível que se descubra até quem mandou matar a vereadora carioca Marielle.

A conjuntura, portanto, se desenha complexa. A uma esquerda marxista leninista cabe manter a linha de acumulação de forças, descartada portanto qualquer ilusão trosco-reformista-gramsciana de ganhar o poder ou parcela dele. É preciso intensificar o trabalho de organização e propaganda nos setores do proletariado a que temos acesso e mesmo de criar estes acessos. É preciso manter a qualquer preço o essencial da linha marxista leninista: a independência do proletariado frente à burguesia e à pequena burguesia.

Venceremos!

 

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