A manobra de Bolsonaro e a crise da Petrobrás

A manobra de Bolsonaro e a crise da Petrobrás

A recente demissão do então presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, e sua substituição pelo general Joaquim Silva e Luna abriu uma “crise” entre Bolsonaro e setores dos mercados financeiro e de ações. Realizada imediatamente após mais um aumento nos preços dos combustíveis — incluindo o diesel tão utilizado por caminhoneiros de todo o Brasil como seu principal insumo —, a demissão de Castello Branco foi interpretada pelo mercado financeiro e pela maioria da imprensa burguesa como uma espécie de “intervenção” de Bolsonaro na estatal, fato que, numa primeira análise, estaria em tese contrariando as políticas neoliberais em vigência no país.

No entanto, como disse Marx, “toda ciência seria supérflua se houvesse coincidência imediata entre a aparência e a essência das coisas”. E, no caso da demissão de Castello Branco, é impossível entender a sua demissão considerando apenas a reação imediata do mercado financeiro. Afinal, do ponto de vista estritamente neoliberal e dentro do que é esperado enquanto reprodutibilidade capitalista, Castello Branco fez uma gestão absolutamente impecável: aumentou os lucros da empresa em níveis sem precedentes, cortou e reduziu ainda mais direitos dos petroleiros e, para completar, acelerou o processo de privatização e venda das subsidiárias da empresa, incluindo parte das refinarias. Considerando a questão desse ponto de vista, não haveria, portanto, motivo algum para Bolsonaro tirar Castello Branco da Petrobrás.

Mas, ao contrário das leituras rasas feitas pela imprensa burguesa, pela esquerda reformista e pela própria direita, a saída de Castello Branco teve mais a ver com o projeto fascista de Bolsonaro do que com uma eventual mudança na orientação da política neoliberal em vigor no país. Tanto é assim que, imediatamente após a saída de Castello, o próprio Bolsonaro anunciou a intenção de privatizar a Eletrobrás, os Correios e outras importantes estatais, dando mais uma sinalização esperada pelo mercado.

A real motivação para a saída de Castello foi a necessidade de Bolsonaro continuar não somente acumulando forças rumo à construção de seu projeto fascista, mas de acumular forças por meio da apropriação de um forte símbolo da nacionalidade brasileira, que é a Petrobrás. Uma empresa cuja história remonta, no imaginário social, às histórias lutas e mobilizações pelo petróleo, pela independência econômica e pelo desenvolvimento do Brasil.

Como se sabe, historicamente os fascismos sempre precisaram se apropriar dos símbolos da nacionalidade e da noção de pátria, como forma de se legitimarem. Foi assim com Hitler, na Alemanha; com Mussolini, na Itália; com Franco, na Espanha; e com Salazar, em Portugal. E está sendo assim com Bolsonaro e seu fascismo brasileiro. Não é à toa que a consigna utilizada por Bolsonaro já campanha eleitoral de 2018 foi ‘Brasil acima de tudo, Deus acima de todos’, que remete ao conhecido lema integralista ‘Deus, Pátria e Família’.

Ao substituir Castello Branco por um militar na Petrobrás — maior empresa estatal do Brasil e até hoje símbolo da nacionalidade —, Bolsonaro tenta assim coesionar e fortalecer ainda mais sua base social de apoio, incluindo os mais de 6.500 militares que já ocupam postos em seu governo, os militares da ativa que ainda não fazem parte de seu governo, setores nacionalistas da direita e, obviamente, os caminhoneiros que tanto apoiaram sua eleição em 2018. Caminhoneiros que, historicamente, sempre foram uma categoria que atuou como “tropa de choque” da direita e da reação, com poder de paralisar toda a economia.

A aparente “contradição” entre a saída de Castello e as expectativas do mercado financeiro para a gestão da Petrobrás são, portanto, apenas isto mesmo: uma aparente contradição. Até porque, no essencial, não foram modificados os eixos centrais e estruturantes da política econômica neoliberal e pró-imperialista em vigor no país.

Além de se apropriar dos símbolos da nacionalidade e governar no essencial para os interesses burgueses, todo fascismo e sua forma bonapartista de governo precisa prestar contas aos setores proletários e de trabalhadores que também conformam sua base social. Daí a importância, para Bolsonaro, de também aparecer como a liderança política “preocupada” com os aumentos dos combustíveis e com a disparada da inflação.

Bolsonaro continua avançando em seu projeto de poder fascista, como também mostramos ao analisarmos o significado dos recentes decretos que facilitaram ainda mais o porte de armas no país. Mas ainda há, contudo, fortes tensões interinstitucionais dentro do campo burguês, como os seguidos conflitos entre STF e Congresso; entre Bolsonaro e Congresso; e entre Bolsonaro e STF.

Se Bolsonaro vai (ou não) consumar seu projeto, isto é algo que dependerá da capacidade que ele tenha de atrair e coesionar as mais importantes frações burguesas em torno desse programa, o que ainda não está dado, inclusive porque uma possibilidade é a de que seu governo, a depender da conjuntura e do aprofundamento da atual crise política, venha a se tornar disfuncional para a própria reprodutibilidade capitalista no Brasil.

Outra possibilidade a se considerar é a retomada de mobilizações proletárias, mesmo que limitadas ao horizonte sindical, devido ao aprofundamento da crise econômica. Fato que também criaria dificuldades adicionais ao projeto bolsonarista.

A nós, comunistas, cabe combater Bolsonaro e seu projeto fascista a partir de uma estratégia proletária que, entendendo as lutas de classes como motor da história, contribua para o avanço organizatório, político e ideológico de toda a classe.

Venceremos!

 

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